
Título: O Círculo
Autor(a): Dave Eggers
Editora: Companhia das Letras
Nº de páginas: 522
Onde comprar:Submarino | Saraiva | Americanas
Nota:
Encenado num futuro próximo indefinido, o engenhoso romance de Dave Eggers conta a história de Mae Holland, uma jovem profissional contratada para trabalhar na empresa de internet mais poderosa do mundo: O Círculo. Sediada num campus idílico na Califórnia, a companhia incorporou todas as empresas de tecnologia que conhecemos, conectando e-mail, mídias sociais, operações bancárias e sistemas de compras de cada usuário em um sistema operacional universal, que cria uma
identidade on-line única e, por consequência, uma nova era de civilidade e transparência.
Mae mal pode acreditar na sorte de fazer parte de um lugar assim. A modernidade do Círculo aparece tanto na sua arquitetura arrojada quanto nos escritórios aprazíveis e convidativos. Os entusiasmados membros da empresa convivem no campus também nas horas vagas, seja em festas e shows que duram a noite toda ou em campeonatos esportivos e brunches glamorosos. A vida fora do trabalho, porém, vai ficando cada vez mais esquecida, à medida que o papel de Mae no Círculo torna-se mais e mais importante. O que começa como a trajetória entusiasmada da ambição e do idealismo de uma mulher logo se transforma em uma eletrizante trama de suspense que levanta questões fundamentais sobre memória, história, privacidade, democracia e os limites do conhecimento humano.
O Círculo é sobre transparência e segredos. Num mundo onde informação é poder e privacidade é um luxo, O Círculo nos mostra que, se não formos transparentes com todos os aspectos de nossas vidas, segredos podem acabar nos levando por um caminho sem volta de intrigas e mentiras. Não confiamos em dar nossas informações a um estranho, mas colocamos detalhes de nossas vidas em redes sociais, sem nos darmos conta de que por trás dessas redes existem empresas que têm todos os tipos de informações livres de nossas vidas.
Mae é a nossa protagonista. Ela nos guia durante toda a história, mesmo que em sua própria narrativa ela seja apenas mais uma ovelha num enorme rebanho. Ela não questiona, apenas obedece. Cegamente. Até aí estaria tudo bem se não fosse por um pequeno detalhe: Mae não é uma personagem interessante, nem é aprofundada e muito menos nos mantém hipnotizados em sua história.
O que prende os leitores à narrativa são essas pequenas realizações e revelações que nos fazem reconsiderar a vida online. Mae não tem voz na comunidade do Círculo e busca desesperadamente pelo seu espaço. Para isso ela faz de tudo (e mais um pouco) para conseguir alcançar isso.
Claramente enquanto é atolada de tarefas e metas (e quando digo atolada é REALMENTE atolada por tarefas e mais tarefas, mais manter sua vida social ativa 24 horas por dia), Mae vai sofrendo uma perturbadora lavagem cerebral. Novas telas, gadgets, aplicativos e consumismo exacerbado, e isso é algo sem fim algum. Mae passa de uma aprendiz buscando conquistar um emprego estável a uma mulher insana e paranoica buscando completar uma meta e se manter entre as pessoas mais influentes nas redes sociais. Fora desse ambiente online, Mae tem um ex-namorado e uma família, os únicos que lhe mantêm numa vida estável, real e sadia.
Entretanto são essas as cenas mais complicadas de ler durante toda a narrativa. Mae vive em tensão, não encontra-se no mesmo ritmo que a sua família e parece estar sempre um passo à frente de todos. Ela não se adequa ao mundo deles, como eles também não conseguem um espaço em seu mundo.
Então adivinhe a minha surpresa quando Mae abandona a sua individualidade e privacidade (mais?) para tornar-se garota propaganda? A garota apática conseguiu aquilo que tanto buscava: o seu lugar ao sol, sendo que claramente ele terá um custo alto e definitivamente não ganhou essa posição pelo seu ótimo trabalho. Nada é coincidência na sociedade por trás de O Círculo.
Não é uma história surpreendente. Aliás, se você prestar bem atenção descobrirá o principal mistério da narrativa nas primeiras páginas. Se essa era a intenção do autor, não sei, mas posso adiantar que o final é no mínimo intrigante.
Na realidade, todo o livro é uma enorme intriga na mente do leitor. Mae não é uma protagonista interessante, em nenhum momento. Ela é vazia, apática e manipulável. Um erro do autor ou uma escolha a dedo? Fico com o último.
O Círculo trata da sede de saber, possuir e ser tal conhecimento. Mae é apenas um instrumento nesse mundo, passo a passo ela nos apresenta a ele, mas não para o nosso deleite, e sim epifania. Esse livro me levou a vários questionamentos. Precisamos estar conectados virtualmente o tempo todo? Precisamos ser parte dessa rede com tamanha presença diária? Precisamos ter todo esse conhecimento? Será que o real foi substituído pelo virtual? Será que preferimos o convívio com as pessoas através da internet pois é difícil lidar com elas na vida cotidiana?
É complicado classificar esse livro. Ele é lento, pesado, denso, tenso, dramático e muito, muito verídico. Se você não enxerga a verdade por trás das revelações dessa história, sinto informar, mas você é mais uma Mae na nossa sociedade do Círculo. Eu recomendo esse livro para quem suporta a verdade.